Local do Combate do Seival - Candiota-RS
Por Cássio Lopes:
Em 10 de setembro de 1836, a
Província toda estava em poder dos Farrapos. Os chefes conservadores se haviam
retirado para o Estado Oriental, vencidos nas refregas que sucederam. O inverno havia arrefecido qualquer
possibilidade de luta. Mas, a chegada da primavera já dava prenúncios de muita
atividade.
O Coronel João da Silva Tavares,
um dos poucos, senão o único comandante da Guarda Nacional que permaneceu fiel
ao império. Apesar de ser compadre de líder farroupilha General Bento Gonçalves
da Silva, não aceitou o convite para conspirar e fazer a Revolução. Tavares
após um tempo refugiado no Uruguai entra em território brasileiro com alarido,
como num passeio militar, chamando a atenção dos adversários.
Tomando as margens do arroio
Jaguarão marcha até a Bolena e dali segue para o arroio Candiota, de onde manda
pedir ao Comandante das Armas Bento Manoel às ordens para agir.
Acampado na barra do arroio
Seival teve notícias de que no Passo do Lageado, no arroio Jaguarão, havia uma
força, e foi reconhecê-la.
Era o Coronel Antônio de Souza
Netto, com uma força farropilha, que também sabendo da presença de uma força
imperial nas proximidades, sai para vê-la.
Inicia-se então o movimento de
dois exércitos que em breve se confrontariam. João da Silva Tavares se colocou
em um lugar próximo “a casa dos Lucas e à direita da estrada que se dirigindo
de Bagé vai para Pelotas, deixando à esquerda um banhado”, conforme uns
“apontamentos” existentes nos arquivos da família Silva Tavares. Estava, assim
em posição vantajosa, onde poderia esperar a aproximação do adversário.
Nessa posição assumiu o comando
da primeira ala e a direção geral da ação, cabendo a segunda ala da esquerda ao
Major David Francisco Pereira. Na retaguarda, ficaram quatro companhias.
Antônio de Souza Netto, depois de
localizar os imperiais, vinha em marcha resoluta, a ponto do Major João F.
Caldwell profetizar que “Netto vinha para triunfar”.
Ao se confrontarem as forças
descarregaram suas armas de fogo, mas depois houve o predomínio das armas
brancas. Netto havia recomendado aos seus: “Camaradas, não quero ouvir um tiro
mais... “À carga, à espada e lança!”. O combate foi terrível.
Inicialmente Silva Tavares
carregou com vantagem e fez o adversário retroceder, levando-o de vencida. Mas,
à esquerda comandada pelo Major David Pereira teve que recuar.
Nesse momento há um total
desarranjo do combate. A cabeçada do freio da montaria de Silva Tavares é
cortada, e seu cavalo sai em disparada. Criando-se assim um grande alvoroço
entre os seus. David Pereira, querendo corrigir a ação, vendo a gente do Netto
voltada para aquela inesperada confusão, manda o Tenente Pedro José Nunes
compor a ala direita e arremete outra vez, para recuperar terreno. Atingido pro
um tiro na coxa, cai do cavalo e sua gente se dispersa. O combate que se
anunciara pressurosa se esfacela num instante.
Antônio de Souza Netto fica
vitorioso em campo. O número de feridos, mortos e prisioneiros foi grande. Os
farrapos perderam 1 capitão, 4 tenentes, 6 alferes e 156 soldados. E foram
feitos 151 prisioneiros, sendo 2 majores , 1 capitão e Joca (mais tarde, chefe
maragato na revolução de 1893), o filho do chefe imperial, com apenas 18 anos
de idade.
A república não estava nos propósito
da revolução farroupilha. Ela se fizera para protestar contra a política do
império executava através do Presidente da Província Fernandes Braga. Deposto
este, retornou a normalidade, que veio a se interromper com a chegada do novo
Presidente Araujo Ribeiro que, apesar de liberal não teve a confiança de seus
correligionários.
Embora houvessem homens com
ideias republicanas, ela não era bandeira da revolução. Antônio de Souza Netto
não se manifestara republicano em nenhum momento, assim como Bento Gonçalves da
Silva. Contuto, a República Rio-Grandense nasceu e se institucionalizou.
Após o combate do Seival, a força
comandada pelo Coronel Antônio de Souza Netto veio para o Passo das Pedras,
sobre a margem esquerda do Arroio Jaguarão, em campos de Joaquim Menezes, a 35
km de Bagé. Todos estavam eufóricos e vibrantes com a inusitada vitória. O
acampamento era festivo.
A noite do dia 10 de setembro de
1836, Manoel Lucas de Oliveira e Joaquim Pedro Soares foram à barraca de Netto
para conversar. Comentaram o propósito político daquele movimento e a derrota
da coluna do centro. No decorrer da entrevista, diz a Netto um dos
interlocutores:
- Tanto os revolucionários como
os legalistas empunham a bandeira brasileira. É preciso, entretanto, combater
um princípio, por uma nova ideia, como a de República.
Netto recusou, alegando que era
Bento Gonçalves que dirigia a revolução, e que não cabia a uma tomada de
atitude daquela profundidade sem sua anuência.
Mostraram Lucas e Joaquim Pedro a
inviabilidade de uma conferencia com Bento Gonçalves e a certeza de que este
concordaria com a resolução, pois embora nunca houvesse proclamado de público
essa ideia, a tinha no coração. Depois
de muito argumentar, Netto se deu por convencido e disse:
- Como os senhores dizem que se
não mudam, a forma de governo, não podemos continuar a nos bater com os nossos
inimigos hasteando a mesma bandeira, eu aceito a república. Tomem as
providencias a fim de que ela seja proclamada amanhã, em nosso campo.
Os dois interlocutores completaram:
- Na ausência de Bento Gonçalves,
que é o General em Chefe, deverão ser feitas promoções e o Coronel mais antigo
é João Manuel de Lima e Silva que, além do mais, é oficial da primeira linha.
Ele promovido a general, não agradará aos piratinianos e haverá a divisão entre
os revolucionários. É preciso que o senhor seja aclamado no campo de combate.
- Aceito! Façam as ordens do dia
para serem publicadas.
Naquela mesma noite de 10 de
Setembro, ainda sob os reflexos da jornada gloriosa do Seival, Manoel Lucas de
Oliveira e Joaquim Pedro Soares rascunharam os documentos de proclamação da
República, e da promoção de oficiais para o Exército Repúblicano.
“Ao raiar o sol do dia seguinte,
na margem esquerda do arroio Jaguarão, estava a força de Netto a cavalo. Netto
apareceu com seu piquete a galope no flanco direito dela; depois que recebeu a
continência, foi aclamado General em Chefe do Exército da República Rio-Grandense
em campo de batalha. Joaquim Pedro mandou a força por pé à terra e formar em
quadro, e dentro dele leu a ordem de dia e mais peças oficiais, ultimando
aquele ato com vivas a República Rio-Grandense, ao General Netto e ao Exército
Republicano do Rio Grande do Sul. Estes vivas foram respondidos com muito
entusiasmo pela força e a República foi aceita pelo exército da mesma maneira”.
A partir de então, foi Antonio de
Souza Netto quem “levantou e sustentou a bandeira tricolor da República com
honra e gloria durante a ausência de Bento Gonçalves”.
Quadro da Proclamação da República Rio-Grandense
Pintura de Antônio Pereira
Fonte: Bagé e a Revolução Farroupilha
–Tarcisio Antonio Costa Taborda, 1985, editora CECOM (Departamento de Artes
Gráficas da FUnba)